Petrobras recebe aval para importar 180 mi de m3 de gás da Argentina

Petrobras recebe aval para importar 180 mi de m3 de gás da Argentina

Carlos Schoeps

A recente autorização da ANP para que a Petrobras importe até 180 milhões de m³/ano de gás natural da Argentina via Gasbol, por dois anos, reforça um movimento preocupante de reconcentração da oferta em um único grande agente, justamente no momento em que o mercado livre de gás natural ainda busca ganhar tração e atrair novos supridores.

Esta decisão, apesar de estar dentro dos objetivos estratégicos da Petrobrás, tende a consolidar ainda mais o protagonismo da empresa na formação de preços, na gestão de riscos de suprimento e na ocupação de capacidade de transporte estratégica para o Cone Sul. O gás argentino deveria ser usado como alavanca para ampliar a competição e diversificar portfólios, ampliando a número de importadores e comercializadores acessando a mesma infraestrutura.

Embora seja positivo ver outros agentes autorizados a importar gás da Argentina ou da Volivia e comercializar gás no pais, a assimetria é evidente. O volume negociado e a posse dominante de instalações de transporte e processamento de gas, coloca a Petrobras em outra ordem de grandeza nesse mercado. Ao concentrar a função de principal importador em um player dominante, o país perde a oportunidade de estimular novos modelos de negócio, contratos de importação com diferentes perfis de risco, produtos mais flexíveis e, sobretudo, uma verdadeira disciplina competitiva sobre preços no mercado livre. Em um desenho de mercado orientado pela Nova Lei do Gás e pelo discurso de “quebrar o monopólio de fato”, faz pouco sentido reforçar, na prática, o papel de um único supridor estruturante.

Do ponto de vista da organização do mercado e da segurança de suprimento, faria muito mais sentido que o gás argentino fosse tratado como uma oportunidade para criar um “corredor competitivo” no Gasbol, com múltiplos agentes – produtores, traders, comercializadores independentes e grandes consumidores – participando de forma direta das operações de importação, mediante acesso transparente e não discriminatório à capacidade de transporte. Reservar, na prática, esse papel quase exclusivamente à Petrobras significa limitar o espaço para que novos entrantes construam portfólios próprios, negociem condições diferenciadas com produtores argentinos e tragam inovação contratual ao mercado brasileiro de gás.

Se o objetivo estratégico do país é ter um mercado livre de gás mais dinâmico, plural e eficiente, a função de importador não deveria ser, na prática, permitir concentração na Petrobras. É hora de alinhar a regulação de importação, o uso do Gasbol e as autorizações da ANP com o discurso de diversificação de ofertantes: estimular leilões de capacidade mais competitivos, criar mecanismos que evitem o bloqueio econômico de infraestrutura essencial e priorizar, sempre que possível, estruturas que ampliem o número de supridores com gás importado no Brasil. Sem isso, continuaremos falando em abertura, mas operando, na prática, em um mercado de gás ainda excessivamente dependente de um único agente.

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