O que muda no cálculo do PLD
Carlos Schoeps
Os dizeres da nova lei “puxam” para dentro da Lei 10.848/2004 elementos que já existem na operação real do SIN, conduzida pelo ONS, e que são parcialmente considerados no modelo DESSEM, mas que nem sempre aparecem na formação de preço realizada pela CCEE. Na prática, a lei determina que, sempre que a operação do sistema elétrico tiver de respeitar uma restrição operativa, o preço do mercado de curto prazo (MCP) e o PLD precisam refletir essa mesma restrição.
Ampliação das restrições consideradas na formação de preços
O §4º da lei original listava apenas seis itens: otimização do despacho, necessidades de energia, segurança operativa com curva de aversão a déficit, restrições de transmissão, custo de déficit e interligações. A nova redação acrescenta três elementos: VII – restrições de defluência e armazenamento dos reservatórios; VIII – restrições de rampas de subida e descida das usinas hidrelétricas e termelétricas; e IX – a reserva de potência operativa.
Com isso, a lei passa a afirmar de forma expressa que o conjunto completo de restrições que orienta a operação do sistema também deve ser incluído no cálculo do preço. Esse ponto não estava nomeado na lei original. A partir dessa mudança, a formação de preços deixa de ser, em tese, apenas uma “otimização de energia” e passa a ser uma otimização com restrições operativas explícitas, exatamente na linha do que o DESSEM já faz.
Impactos para o cálculo do PLD
O primeiro impacto é a ocorrência de mais horas com preço elevado mesmo sem falta de energia. Quando o ONS precisa segurar vazão por regra de defluência (como em São Francisco e Tocantins) ou manter volume mínimo por razões ambientais ou de navegação, o modelo passa a enxergar menos energia hidráulica disponível e, por isso, a valorá-la mais. O resultado é que o PLD pode subir mesmo com reservatórios cheios ou com carga baixa, porque a limitação é hidráulica ou ambiental, e não energética. Hoje isso aparece na operação, mas nem sempre no preço.
O segundo impacto é o aumento da volatilidade horária do PLD por causa das rampas de geração. Se uma hidrelétrica não pode subir 300 MW de uma hora para outra, o modelo pode ser obrigado a despachar térmica ou manter geração mais cara ligada antes do horário de pico. Isso eleva o CMO horário e, consequentemente, o PLD horário. Na redação antiga da lei isso era apenas implícito; agora passou a ser mandatório.
O terceiro impacto é a inclusão da reserva de potência operativa dentro do preço. Atualmente, a reserva é tratada principalmente como requisito de operação do ONS, e não como componente de preço na CCEE. A nova redação deixa claro que a reserva deve ser considerada na formação de preços e na contabilização. Assim, se o sistema precisar manter, por exemplo, 500 MW “parados” para garantir inércia, regular frequência ou acomodar variação de eólica e solar, o preço terá de refletir o custo de manter essa folga, pressionando o PLD para cima nas horas em que o requisito de reserva for maior.
Redução de distorções entre ONS e CCEE
Ao determinar que o mesmo conjunto de restrições seja usado tanto na definição de preços quanto na contabilização, a lei enfrenta o problema clássico de o ONS despachar uma usina por uma restrição que não aparece no preço, o que gera ESS ou exposição involuntária de agentes. A tendência, com a nova redação, é o PLD ficar mais aderente ao despacho físico do sistema elétrico.
Base legal para pisos e tetos de preço
O inciso V do novo §5º menciona explicitamente os limites de preços mínimo e máximo definidos pela Aneel (PLD mínimo, PLD máximo estrutural e PLD máximo horário), eliminando dúvidas jurídicas e alinhando a lei ao procedimento que a Aneel vem aplicando desde 2019.
Complemento do §10
O novo §10 passa a incluir, entre as disponibilidades que podem ser consideradas, a reserva de potência operativa — inclusive de usinas hidrelétricas — para atendimento a requisitos de inércia, regulação de frequência e partida autônoma, além da indisponibilidade externa associada a instalações de transmissão. Esse ajuste reforça que os custos de manter unidades geradoras ligadas apenas para prestar serviços ao sistema podem aparecer na contabilização e, portanto, na base de dados utilizada para o cálculo do PLD.