Publicado em 18/11/2025 por Vivian Nascimento
Energia incentivada no mercado livre: freio regulatório e novas regras do jogo
Resumo do que os parágrafos acrescentam à Lei 9.433/1997
- Integração água-energia: a política de recursos hídricos passa a enfatizar, de forma explícita, a utilização racional e integrada dos recursos hídricos incluindo a geração de energia elétrica e o transporte aquaviário, mirando desenvolvimento sustentável (novo inciso II do art. 2º).
- Segurança hídrica e energética: a lei passa a garantir segurança hídrica e energética por meio do incentivo e promoção de obras de acumulação de água (novo inciso V do art. 2º e novo inciso VII do art. 3º).
- Gestão coordenada: reforço da integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental e com a gestão eletroenergética (novo inciso III do art. 3º).
Implicações para usinas existentes (hidros e demais)
- Prioridade institucional para reservatórios: projetos e intervenções que aumentem capacidade de acumulação (elevação de crista, reassentamento de volumes mortos, novos diques auxiliares, recuperação de reservação) ganham base legal mais favorável na hierarquia de políticas públicas.
- Revisão de regras operativas: maior espaço para compatibilizar defluências, níveis mínimos e navegação com a confiabilidade do SIN. Na prática, podem ocorrer ajustes de curvas-guia e de regras de uso múltiplo em planos de bacia, afetando sazonalidade de vazões turbináveis.
- Licenciamento e outorgas mais “casadas”: o texto pressiona por processos coordenados (água, meio ambiente e energia). Para o empreendedor, tende a reduzir idas-e-vindas entre órgãos, mas pode exigir estudos integrados mais robustos (cenários de seca prolongada, impactos cumulativos e navegação).
- Sinal para retrofit e modernização: reforço argumentativo para repotenciação, automação, melhoria de vertedouros e sedimentação (manter/recuperar volume útil), com benefícios regulatórios possíveis (vida útil regulatória, ganhos de garantia física).
- Conflitos e contrapartidas: ao privilegiar acumulação, custos sociais/ambientais (reassentamentos, APPs, ictiofauna) podem aumentar; a contrapartida é maior previsibilidade energética e redução de ESS por despacho térmico em estiagem.
Implicações específicas para a geração hidrelétrica
- Valorização de usinas com reservatório: ativos com armazenamento significativo tendem a ganhar relevância sistêmica (flexibilidade e segurança). Isso pode influenciar leilões de capacidade, metas de reserva operativa e valoração de serviços ancilares (controle de rampa, inércia).
- Pior posição relativa de fio d’água: PCHs/UFAs a fio d’água, com pouca ou nenhuma acumulação, podem perder atratividade relativa, a menos que venham hibridizadas com BESS ou combinadas com gestão de carga (para reduzir cortes e aumentar valor em horas críticas).
- Janela para usinas reversíveis (bombeamento): o foco em “acumulação” abre mais espaço para hidrelétricas reversíveis como solução estruturante de armazenamento (sinergia com eólica/solar).
- Itaipu e grandes reservatórios: o novo texto facilita coordenação intersetorial para conciliar energia e navegação; pode amparar projetos de otimização (sedimentação, faixa de operação) com impacto positivo na garantia física e na redução de curtailment em períodos chuvosos.
O que monitorar (riscos e oportunidades)
- Planos de bacia: revisão de enquadramentos e outorgas poderá redefinir vazões remanescentes/defluências—importa acompanhar cada comitê de bacia.
- Normas infralegais: critérios de “obra de acumulação” (o que conta?), prioridades de investimento e procedimentos de compatibilização com licenças ambientais.
- Regulação setorial: como ONS/ANEEL/ANA converterão a integração em regras de operação, preço e encargos (efeito em ERCAP, ESS e eventual valorização de flexibilidade).
- Sociambiental: exigências adicionais de mitigação/compensação podem estender cronogramas—planejar consulta pública e comunicação em comunidades desde o estudo de alternativas.
Em uma linha
A lei passa a ancorar, em nível de política pública, que reservar água é também política de segurança energética, e que água-ambiente-energia devem ser geridas em conjunto. Para quem opera ou investe em hidrelétricas, isso abre avenidas para ampliar/recuperar reservação e valorizar flexibilidade, com exigências técnicas e socioambientais mais integradas.