Energia firme renovável e despachável é necessário?
Entre janeiro e julho, o Brasil adicionou 4.200 MW de nova capacidade de geração, impulsionado principalmente pelas fontes solar e eólica. Com esse avanço, a potência instalada nacional atingiu 212.650 MW em agosto, dos quais 84,45% provenientes de fontes renováveis. Esse movimento reforça o protagonismo das renováveis na matriz elétrica brasileira, que segue em ritmo acelerado de expansão, enquanto 88 novas usinas, somando 3.063 MW, ainda estavam em fase de testes em julho.
O rápido crescimento das fontes intermitentes e não despacháveis, como solar e eólica, aumenta os riscos de abastecimento, sobretudo nos horários de maior consumo. Nesses períodos, a produção dessas fontes pode não estar disponível para atender a demanda, pressionando a operação do sistema. A limitação de recursos com maior flexibilidade operativa pode transformar esse avanço em vulnerabilidade, uma vez que o Operador Nacional do Sistema (ONS) precisa recorrer à operação de usinas termelétricas que levam maior tempo para aumentar sua geração para equilibrar oferta e demanda, resultando em custos elevados para os consumidores.
Conciliar segurança energética com a expansão renovável exige um conjunto de soluções complementares. O investimento em sistemas de armazenamento em larga escala, aliado ao uso estratégico das hidrelétricas com reservatórios, pode assegurar a regularidade no suprimento. Além disso, políticas públicas que valorizem atributos de confiabilidade, juntamente com redes inteligentes e mecanismos de resposta da demanda, são fundamentais.
Outras soluções a serem exploradas em nossa matriz de geração é o estímulo às hidrelétricas reversíveis (UHR) e a expansão da energia nuclear. As hidrelétricas reversíveis é uma solução estratégica para atendimento aos horários de maior consumo a custos baixos. O acionamento do bombeamento pode ser dirigido para horários de maior geração de usinas solares, por exemplo, ajudando a estabilizar a rede e reduzir o desperdício de energia renovável.
O potencial das Usinas Hidrelétricas Reversíveis (UHRs) não está sendo devidamente considerado como ativo estratégico para a estabilidade do sistema elétrico. Esses empreendimentos podem ser ativados de forma modular e escalável, aproveitando estruturas em regiões próximas ao centro de carga.
Estudos recentes do setor identificaram, nas regiões Sudeste e Centro-Oeste, um potencial superior a 100 GW em Usinas Hidrelétricas Reversíveis (UHRs). Entre os projetos potenciais, destacam-se a expansão da UHR de Serra da Mesa em Goiás e a implantação de UHRs no complexo de Furnas em Minas Gerais. Outras UHRs poderiam ser integradas a reservatórios existentes, aproveitando infraestrutura hídrica já consolidada, o que reduziria custos de investimento e prazos de implementação, contribuindo significativamente para a confiabilidade do suprimento elétrico e para a mitigação dos riscos associados à intermitência das fontes renováveis.
A China vem fazendo fortes investimentos em Usinas Hidrelétricas Reversíveis, alcançando 48 GW em operação, mas a replicação desse modelo em outros países enfrenta diversos desafios. O Vietnã e o Marrocos, por exemplo, estudam ampliar a integração de energias renováveis, mas enfrentam limitações técnicas, financeiras e regulatórias que podem comprometer a eficácia desses projetos.
A adoção de UHRs exige não apenas investimento em infraestrutura, mas também planejamento integrado com a matriz existente e sistemas de operação sofisticados; sem isso, há risco de subutilização ou de ineficiências operacionais. Embora o potencial das UHRs seja elevado, a replicação de modelos de sucesso internacional não garante automaticamente resultados consistentes, sendo necessária uma adaptação à realidade técnica e operacional de cada país.